terça-feira, 15 de outubro de 2013

João Abrantes, latoeiro

 
Sempre o conheceram como João «Latoeiro» mas hoje João Abrantes de Oliveira, 71 anos, pouco já exerce da profissão que o acompanhou a vida toda em Alquerubim, Albergaria-a-Velha.

«Isto é para acabar. Quando o senhor chegou estava a ler o jornal. De vez em quando reparo qualquer coisa mas de resto, há muito tempo que o plástico e as máquinas acabaram com a arte», explica. «O que me vale é ter uma “reformazita”, milho, couves, feijões, vinhas, duas vacas. Se vivesse na cidade estava mal...».

João «Latoeiro» nasceu em Fontinha, no concelho de Águeda. «Comecei na arte com o meu pai, em Fontinha. O meu pai era latoeiro, os irmãos dele também e eu e outro irmão começámos com ele». Na zona, há uns 50 anos, existiam muitos latoeiros para servir, sobretudo, a agricultura: «Que eu me lembre havia quatro em Águeda, três na Fontinha, dois em Mourisca do Vouga e em Eixo e São João de Loure mais uns três ou quatro. Que eu saiba sou o último».


Quando o pai faleceu, o irmão de João estabeleceu-se em Travassô e João atravessou o rio Vouga para se fixar a norte, em Ameal, na freguesia de Alquerubim, concelho de Albergaria-a-Velha. «Não faltava trabalho. Vendia muitas latas para o azeite, latas para o leite, cântaros para o vinho. Sabe que aqui na zona toda a gente tinha vacas, toda a gente produzia vinho. Hoje há muitos que já não querem as videiras…».

O declínio começou com a transformação do mundo rural e o advento do plástico. «As pessoas passaram a comprar tudo em plástico, mais barato, mais fácil de transportar. Não me vão encomendar uma coisa em inox que vai custar mais caro quando têm tudo às dúzias em plástico nos chineses...».

A oficina, que mantém na garagem de casa, paredes meias com a adega, ainda tem tudo com que João trabalhou todos estes anos, desde martelos, alicates, tesouras, rebarbadoras, bigorna, solda, torno, chapas. «E se vir com atenção, ainda para aí tenho muita coisa, só que já não se vende. Olhe ali aqueles regadores. E os funis? Lá adiante ainda tenho muitas candeias, cântaros».

Há tempos, a escola local interessou-se pelo trabalho de João «Latoeiro» e organizou uma visita guiada. «Os miúdos gostaram de vir cá ver isto, já não vêem em mais lado nenhum mas infelizmente ninguém aprende a arte hoje em dia».

Fonte: Café Portugal (Nuno Ferreira)

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